as almas, os pássaros

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sexta-feira, 22 de maio de 2009

Hoje percorri toda a cidade a pé. Uma cidade cheia de colinas. Gostei de imaginar-me invisível entre a multidão. Colina abaixo, colina acima, os edifícios, como árvores mutantes de betão, o céu azul e branco, por cima, o céu, a voar sobre a minha cabeça, a voar sobre a cidade, a voar sobre as árvores mutantes de betão, a voar sobre a multidão, eu invisível, de pés leves, quase sem tocarem o chão, o vento de norte a brincar-me com os cabelos, a puxar-me pelas roupas, leves, como os pés. Hoje passeei na cidade e procurei-te por toda a parte, mesmo sabendo que não ia encontrar-te, se te encontrasse, não me verias. Passeei invisível, os pés flutuantes, serias mais um na multidão que me não veria, sentirias apenas um sopro no pescoço, como uma refrega mais quente. Caminhei e caminhei, quase dancei e cheguei à avenida cheia de plátanos, caminhei mais devagar sob eles como quem caminha na floresta, caminhei sob os plátanos centenários e cumprimentei-os a todos, como velhos amigos, as árvores de prata e oiro, agora de prata, vestidas de verde, minhas companheiras de sombra e claridade. Desci a avenida em direcção ao rio, sempre por entre os plátanos, a cidade e os carros e o barulho desapareceram, levantei voo até às copas de folhas pentalobadas, o verde a brincar com o oiro da luz, misturei-me com elas, com as folhas verdes e douradas, com os dedos esguios dos plátanos de tronco prateado e desfiz-me.

quinta-feira, 12 de junho de 2008

O sal das lágrimas veio do mar há eras atrás, quando eu era um peixe. Trouxe o sal comigo, pois quando rastejei pela areia com pequenas patinhas quase inúteis, não consegui abandonar totalmente o grande azul e trouxe a água e o sal dentro de mim. Já sentia a pele a secar, quase a arder e as escamas a caírem, uma a uma, deixando em mim um rasto de sangue e já tinha tanta, tanta saudade, que ainda hoje me pergunto porque deixei aquela luz azul. Cá fora, antes que eu desse dez passos, milhares de minúsculas criaturas entraram por todos os meus orifícios e mataram-me ali, quase imediatamente. Desovei antes de morrer numa cova na areia e os meus filhos, assim que nasceram, levaram com eles as patas, já biologicamente avançadas, a água e o sal. Lembro-me disto agora porque estou longe do mar, morri muitas vezes, mas ainda aqui estou e sempre que choro, lembro-me dele, do mar, tudo por causa do sal que ainda existe nas lágrimas.

terça-feira, 20 de setembro de 2005

Hoje em dia a Humanidade começa a colocar-se a questão se deveremos ou não viver para sempre. Isto porque a imortalidade começa a parecer possível, tendo em conta os mais recentes avanços da ciência. Os geneticistas procuram freneticamente o gene do envelhecimento, o gene ou grupo de genes responsáveis por interromperem a vida de cada criatura viva. Mas talvez, quando o encontrarem, descubram que esses genes são multi-funções e que não podem manipulá-los, sem consequências. Tenho a certeza absoluta de que assim será. Tenho a certeza absoluta de que o Homem está muito longe desse tipo de imortalidade. O código genético é, de facto, fascinante. Mas o porquê, o porquê desse código genético, como foi escrito, o que é que leva a que determinados genes sejam activados e outros desactivados, ainda o é mais. Podemos ter em nós os genes das asas, por exemplo, e penso que os temos, no entanto, o Homem não tem asas. Podemos ter em nós os genes das barbatanas e das folhas das árvores e dos olhos das águias e das corolas das flores e da produção das teias de aranha e dos dentes do tigre, e no entanto, não temos barbatanas, nem abanamos ao vento, verdes como esmeraldas, nem vemos o que as águias vêm, nem as abelhas pousam em nós em busca do pólen que não produzimos, nem andamos a fazer teias de aranha durante a noite nem roemos ossos como o tigre. Mas temos em nós todos esses genes. Tomemos os genes das asas, por exemplo. Michio Kaku escreve que não é assim tão simples, termos asas como os anjos e continuarmos humanos. Para termos asas, provavelmente perderíamos as pernas e a figura longilínea que hoje temos, e os nossos ossos teriam de ser ocos. Quem toma estas decisões? Quem decidiu que vivíamos melhor fora de água? Quem decidiu que tínhamos que envelhecer e morrer? Quem decidiu que a melhor forma de não haver desperdício era comermo-nos uns aos outros? Quem decidiu ter pernas e não ter asas? Ou são fruto do acaso, do ambiente, das circunstâncias?
E o que aconteceria, se o Homem se tornasse Imortal? O que aconteceria às crianças? Deixaria de haver crianças? Quanto tempo aguentaria uma pessoa viva? O que faria com a sua imortalidade?
Woody Allen diria que não se importa. Ele diz que não quer sobreviver nas suas obras, que apenas quer sobreviver, ponto final. E o que aconteceria, se o Woody Allen vivesse para sempre? Estaríamos condenados a ver o mesmo tipo de filme para toda a eternidade, ou poderia o Woody Allen vir a fazer filmes como o Cinema Paradiso ou como Le Grand Bleu? Evoluiríamos? O que aconteceria aos nossos genes? Experimentariam as asas?
Claro que me dói, com graus diferentes de dor, quando morrem os meus ou quando morre uma poetisa como a Sophia de Mello Breyner.
Mas eu não quero a imortalidade. Não a minha. Prefiro ser uma chama, que arde e depois se apaga, uma estrela que acaba, o risco de um voo, a espuma de uma onda que nunca se repete. Eu não sou eu. Eu não sou um indivíduo. Eu não sou apenas um indivíduo, tal como as partículas não são apenas partícula, mas partícula e onda, ao mesmo tempo. Eu sou nós, sou parte de um tudo, sou a chama que não arde e as asas que não voam e a espuma que não rebenta na praia e os olhos da águia que não são. Sou a estrela que já implodiu e a chuva que já caiu e o vento que já soprou e a abelha que já morreu. Sou a terra e o mar e a árvore, sou a pedra na areia e também sou o pombo envenenado e o lince extinto e o dinossauro e a formiga e um diamante na rocha.
E voltarei a sê-lo um dia.
Prefiro a Eternidade à Imortalidade.

quarta-feira, 14 de outubro de 1987


Sinto-me como esta estação que morre. É sempre assim em setembro. Mas este ano é particularmente dolorosa para mim, esta morte do verão. Ontem, sentada num banco de madeira no jardim que não é meu, olhava as folhas secas das árvores, que se soltarão com o primeiro sopro de vento, os limões ressequidos - o limoeiro também morreu, este ano - sentia aquele calor estúpido, aquela secura na alma, aquela angústia, aquela fúria de tudo parecer perdido, terminado. Quando a Maria telefonou, só lhe disse: Esta noite já não faço mais nada, vou dormir, se saio de casa ainda me cai uma árvore em cima, estou péssima. Não, também não gostei do último da Duras. Concordo que é patológico, por isso mesmo não gostei. Não estava em condições de o ler. Sentiste-te gozada? Talvez fosse essa a intenção dela. Ou talvez ela seja doente. Pouco depois, telefonou-me o Pedro. O sono não vinha. Estava eléctrica como aquela atmosfera doentia. Fomos beber umas cervejas e isso fez-me bem. O Pedro é tão normal, tão saudável. Tem planos, sonhos, futuro. Rimo-nos imenso. Rir faz bem. A noite, ali passada ao ar livre, no Rossio, no meio do povo, deixou de me parecer sufocante. As ruas estavam molhadas dos carros da limpeza, levantara-se uma humidade fresca do chão. Havia ainda imensos estrangeiros de férias com cara triste, desiludida. Tinham vindo atrás de um sonho e chegado à conclusão de que todas as cidades são cidades e são sujas e são barulhentas e, assim, nada melhor que a nossa cidade natal, que ao menos é nossa, é familiar, criamos-lhe um certo amor enraivecido, apesar de tudo. Conhecemos os cheiros, a sujeira, o barulho e já não nos chocam e até são de graça. São nossos, como talvez seja nossa a nossa alma. Não sei. Gostei de estar ali com o Pedro. Gostava que ele fosse meu amigo mas nestas idades já não se chega a conhecer ninguém. As crianças dormem, a partir dos vinte anos, às vezes mais cedo, às vezes mais tarde. Sobra nas pessoas aquele ar igual, a noite das almas, à noite todos os gatos são pardos. Furar os medos, abrir um pequeno buraco na desilusão, é quase impossível. Penso agora no Pedro, no perfil dele. Quem é a pessoa que está por detrás do seu sorriso? Como é que eu chego lá? Mais difícil ainda, como é que eu me descubro, me abro, me revelo? Porque não vem chuva da montanha para nos molharmos? E onde ficam todas essas lágrimas reveladoras que não são choradas? Às vezes, sou eu que não ouço. Escuto-me a mim mesma, às conversas dos bêbedos, ao barulho dos carros, aos silêncios da minha alma que se escapa para longe da rua iluminada, além das estrelas. Outras vezes, é ele que não ouve. Não sei onde está a alma dele, talvez mais perto da minha do que posso imaginar, também lá, longe dos telhados, atrás das estrelas. Bebemos a cerveja fresca e rimos dos turistas, conscientes de que também somos turistas na nossa própria cidade natal. Tudo é sempre terrivelmente desconhecido. Não é um abismo. É um silêncio por detrás do barulho, a verdade atrás das palavras, as almas encavalitadas na mesma lua, as mãos separadas, ouvimos palavras diferentes e nem nos lembramos das palavras faladas. Um homem forte, de tronco nú e barba escura, está debruçado a uma janela. Espreita a rua e não olha para nós. Tem um ar encalorado de insónia. Gostava de saber o que está por detrás do homem, como é o quarto. Não sei como é que sei que por detrás do homem está um quarto. Sei-o, muito simplesmente. Imagino um quarto pequeno, uma cama estreita encostada à parede, um armário do outro lado, de madeira velha, com um espelho, pouca luz, as paredes amarelas da pouca luz e da sujidade. Imagino que o homem não consegue dormir e nem tem saudades de nenhuma mulher. Está apenas ali, à janela, à espera que o barulho acabe. Não tem vontade de se misturar com os bêbedos ou com os turistas. O mais provável é que não pense em nada. Se eu lesse a alma dele atrás dos olhos que mal se vêem, escrevia um livro, parecido com isto que estou a escrever. Escrevia a história do homem à janela com o verão a morrer, escritor falhado, trabalha num escritório num prédio velho da baixa lisboeta. E está farto, farto, farto. As histórias são todas iguais. A Maria diz que as pessoas tão patológicas como as pessoas da Duras deviam suicidar-se. Só assim ela poderia perdoar à Duras aquela sensação de nojo que ela lhe deixou. Ela ficou assim enojada por ter lido o livro. As pessoas não deviam escrever livros que deixassem as outras com nojo. Mas nojo de quê? Só sei que também fiquei enojada. Enojada da dor. Há dores que são nojo, como a dor do luto, ou esta última dor das feridas que arrefecem, das cicatrizes a sararem mal, sem bálsamo algum, ao ar, com a infeção dentro como restos que apodrecem. O nojo é nosso. De alguma dor que sentimos, de algum monstro que existe dentro de nós, prestes a devorar-nos. Não me suicidei. Estou no controlo. Pelo menos à superfície, o mar foi encarcerado, poderosamente encarcerado e o que se passa lá no fundo, não quero saber, é cedo demais para saber, também não interessa. A opção é a vida, o melhor é olhar em frente ou para o lado. Ao lado estava o Pedro, bem-disposto, falávamos das peles que ligam e das peles que não ligam, de Curaçao e de Itaparica. Eu, só posso falar de mim, cada pessoa que fala, diga o que disser, fala sempre e apenas de si mesma, eu sentia a minha juventude a saltitar-me entre as mãos. Como pássaros. Estava contente com essa juventude mas, como qualquer jovem, não sabia bem como usá-la, o que fazer com ela. Já quase a destruíra uma e outra vez, agora olhava-a, desconfiada, enquanto ela pulava nas minhas mãos e me fazia cócegas atrás das orelhas. Como fazer para não a estragar, para não a partir aos pedaços? Em primeiro lugar, não a entregar a ninguém. Nem mesmo ao Pedro. Fiquei com medo das almas cegas. São profundamente estúpidas na sua cegueira e atiram aos pássaros, geralmente acertando, embora ao acaso. Eu sei, eu sei que o Pedro talvez possivelmente não tenha uma alma cega, mas posso apenas falar de mim mesma, porque uma pessoa consegue única e exclusivamente conhecer-se a si própria em absoluto mais ou menos. Sei uma coisa, que este pássaro agora é só meu. Claro que um pássaro partilhado noutro vento podia - e digo, poderia - ser qualquer coisa mais bela. Mas não arrisco um novo encontro naquele deserto onde vivem as almas cegas. Posso guardar este pássaro só para mim. Manter-me sempre afastada, distante. Rir dos atiradores ao acaso. Podes atirar, não chegas cá! Agora, os céus são altos e imensos, claro que me sinto perdida e só, mas longe, longe, e é bom estar longe quando o perto foi quase morte. Não disse por isso ao Pedro que a pele dele ligava com a minha, até ligava muito bem. Deixei ficar isso no ar, como outro pássaro a rir-se empoleirado num ramo distante de um gato espantado. Não vale a pena trepar. Eu fujo. Tenho asas e tu não. Foi a Mélita que primeiramente me falou na teoria amena e sensual das peles. Da humidade, do calor, da textura das peles. Talvez retractem a violência das paixões ou os sentimentos virginais de certos desencontros. E também há peles sem personalidade nenhuma, como a pele daqueles pseudo-gigolos atrás das árvores, olhando as estrangeiras velhas com um ar guloso de dólares, marcos e francos suíços. De repente, alheei-me daquilo tudo. Já não estava assim tanto calor. A cerveja estava fresca e eu sentia-me bem com aquele pássaro desconhecido e perigoso entre as mãos e a proximidade do pássaro do Pedro, que espreitava nos olhos dele, menos rebelde, fluindo com as palavras, como a música de Mozart tocada num velho caramanchão numa noite de luar, com rosas e um perfume doce a canteiros molhados. Cada alma é uma interrogação universal. Quando cheguei a casa, dormi bem. Tinha deixado a morte do verão atrás das costas, o pássaro era eu, agora, debaixo dos lençóis frescos, a dormir embalada na esperança da manhã fresca. Enquanto houver manhãs.

domingo, 1 de março de 1987

Escorrem as saudades, como água, pelas pedras. Uma ave a arder contra um rio de pedra [do cais]. Iluminemos todas as manhãs de água. Uma pedra chora no vento e tomba na proa do teu barco, com um ruído surdo, de agonia. Recusemos o medo, de mãos dadas, sobre a pedra mais alta. No cimo da montanha estamos sós, mas respiramos o corpo do mar, solto no vento. Cala-te e deixa-me chover, o rosto contra esta espada. Tenho frio. Mas o amor é azul, como o céu por detrás das nuvens, a paixão dói quando chega ao mar, como um barco, de proa aberta, ferida [vingado que foi, o leito do rio, por cada brisa ou boca que nele tocou, solta, louca, antecipando o vento que nunca foi]. Sobrou apenas um canto, também azul, ou doce, ou amargo, como gritos ou rios de março, pelo chão.
Ficou um homem no cais, as mãos vazias, morre lentamente, os olhos a devorarem o rio. O barco, o barco, será que o barco parte?
Que sonho, o do barco, de querer arrancar o cais de terra e largar com ele! Agora, até as aves soltaram as mãos, como asas, de encontro ao mastro alto. Agora, um novo rumo se inscreveu, na luz matinal do meu corpo, largando amarras, do teu. Porque nem as tuas mãos cresceram nem a minha alma diminuiu. Mas o amor é azul, a paixão escalda, de luz. Azul era o mar na tua mão, em junho. Azuis eram as minhas mãos sobre o teu peito e a tua boca na minha. Azul foi Sesimbra, em março, o meu barco fundeado ao largo, na luz da tarde, transformou o homem em criança no meio dos destroços [da minha vida?]. Não devia ter olhado para trás, riu-se de mim. Ou será antes um pedido de socorro? A criança chora ou ri. O homem sofre. A vida é assim, a espreitar por entre os teus cabelos brancos, a tua pele a arder na minha, os olhos fechados. Já nem choram pedras. Choveram, até arder. As aves também ardem. Ou partem. Não olhes para mim com esses olhos. Porque é que tinhas que ser apenas cais? O cais não pode navegar. E o barco largou, ó esqueci-me das velas no cais! E a maré enche, até quando? Brisa a brisa, beber a pele poro a poro, não queiras agora vencer a corrente dos rios de março, vastos, tumultuosos. Lembras-te de como o amor era para ti um lago sombrio? Para mim era uma cascata. Podia ter sido um outro rio [levar-te comigo]. De qualquer forma, havia uma foz e, para além da foz, o mar. Como querias conquistar-me, preso ao cais? Amar não basta. Cada vez menos, quando os beijos são como mastros sem velas ou velas sem mastros, as palavras, ficaram pousadas do outro lado das mãos. E a maré enche, até quando? Porque olhos nos olhos, nunca! O medo nas tuas mãos macias! O medo no teu corpo a tremer no meu! Porque é que te refugiaste no ventre da terra? O sol nasce todos os dias, agora morreu nos nossos olhos, que nunca se cruzam. E a minha cor é azul, fundamentalmente no vento, quando o azul é branco, de luz. O vento, agora procuras-me no vento, mas fez-se tarde. Ficou a sede no coração das nascentes, entorpecidas, estonteadas [além de ti, é sempre o mesmo mar e eu sou barco]. E toda aquela prata, ali, espalhada no corpo da areia, era novembro. As falésias e a luz na água. E o vento a ensinar-me a amar. Nessa altura, ainda podia olhar para os teus olhos. Fascinavam-me. Nessa altura, os teus olhos eram ainda brilhantes e intensos rios de luz, em abril. A chuva esquecera-se de aparecer e o desejo pode despir-se. Fascinou-me a candura no teu olhar, a agressividade nas palavras, que mordiam o meu ventre. E a vida, a vida assim a espreitar por entre os teus cabelos brancos, o barco sonhou e sangrou. Mesmo assim, apesar das lágrimas e do caos, talvez o cais seja barco e seja ave, como a mulher que o amou, talvez a piedade abra ainda o seu caminho através dos escolhos, segundo Schopenhauer. Não sei. Naquela tarde, o cão da Berlenga, cego, pousou o focinho nos meus joelhos. Mais tarde. Mais tarde, pensei, construirei algo com ele. De forte e sólido. Como esta ilha. Como esta pedra. Como um barco. Naquele dia, de madrugada, choveram-me todos os cantos na boca vazia da tua. Um outro abril, a chuva, afinal, não está esclerosada. Mas sobrou ainda aquele canto azul, ou doce, ou amargo. Da ave ardida contra o rio de pedra. E as tuas mãos, pequenas, mas doces.

Março de 1987
2º Prémio DN Jovem

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