as almas, os pássaros

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as almas, os pássaros

as almas, os pássaros

sábado, 16 de dezembro de 2023


even now 
the world is bleedin' 
but feelin' just fine all numb in our castle 
where we're always free to choose 
never free enough to find 
i wish somethin' would break 
cuz we're runnin' out of time

and i am overcome 
i am overcome 
holy water in my lungs 
i am overcome

these women in the street 
pullin' out their hair 
my master's in the yard 
givin' light to the unaware 
this plastic little place
is just a step amongst the stairs

and i am overcome 
i am overcome baby 
holy water in my lungs 
i am overcome

so drive me out 
out to that open field 
turn the ignition off
and spin around 
your help is here 
but i'm parked in this open space
blockin' the gates of love

i am overcome 
i am overcome 
holy water in my lungs 
i am overcome

beautiful drowning 
this beautiful drowning 
this holy water
this holy water 
is in my lungs

and i am overcome
Eis aquele que não libertei da pedra


Escultura de Michelangelo, Escravos


segunda-feira, 11 de dezembro de 2023

sexta-feira, 24 de novembro de 2023





quem deixou sobre o coração
um feixe de luz
não cega nunca

valter hugo mãe in folclore íntimo
I


Que este amor não me cegue nem me siga.
E de mim mesma nunca se aperceba.
Que me exclua do estar sendo perseguida
E do tormento
De só por ele me saber estar sendo.
Que o olhar não se perca nas tulipas
Pois formas tão perfeitas de beleza
Vêm do fulgor das trevas.
E o meu Senhor habita o rutilante escuro
De um suposto de heras em alto muro.
Que este amor me faça descontente
E farta de fadigas. E de fragilidades tantas
Eu me faça pequena. E diminuta e tenra
Como só soem ser aranhas e formigas.
Que este amor só me veja de partida.


II


E só me veja
No não merecimento das conquistas.
De pé. Nas plataformas, nas escadas
Ou através de umas janelas baças:
Uma mulher no trem: perfil desabitado de carícias
E só me veja no não merecimento e interdita:
Papéis, valises, tomos, sobretudos
Eu-alguém travestida de luto. (E um olhar
de púrpura e desgosto, vendo através de mim
navios e dorsos).
Dorsos de luz de águas mais profundas. Peixes.
Mas sobre mim, intensas, ilhargas juvenis
Machucadas de gozo.
E que jamais perceba o rocio da chama:
Este molhado fulgor sobre o meu rosto.


III


Isso de mim que anseia despedida
(Para perpetuar o que está sendo)
Não tem nome de amor. Nem é celeste
Ou terreno. Isso de mim é marulhoso
E tenro. Dançarino também. Isso de mim
É novo: Como que come o que nada contém.
A impossível oquidão de um ovo.
Como se um tigre
Reversivo,
Veemente de seu avesso
Cantasse mansamente.
Não tem nome de amor. Nem se parece a mim.
Como pode ser isso? Ser tenro, marulhoso
Dançarino e novo, ter nome de ninguém
E preferir ausência e desconforto
Para guardar no eterno o coração do outro.


IV


E por que, também não doloso e penitente?
Dolo pode ser punhal. E astúcia, logro.
E isso sem nome, o despedir-se sempre
Tem muito de sedução, armadilhas, minúcias
Isso sem nome fere e faz feridas.
Penitente e algoz:
Como se só na morte abraçasses a vida.
É pomposo e pungente. Com ares de santidade
Odores de cortesã, pode ser carmelita
ou Catarina, ser menina ou malsã.
Penitente e doloso
Pode ser o sumo de um instante.
Pode ser tu-outro pretendido, teu adeus, tua sorte.
Fêmea-rapaz, ISSO sem nome pode ser um todo
Que só se ajusta ao Nunca. Ao Nunca Mais.


V


O Nunca Mais não é verdade.
Há ilusões e assomos, há repentes
De perpetuar a Duração.
O Nunca Mais é só meia-verdade:
Como se visses a ave entre a folhagem
E ao mesmo tempo não.
(E antevisses
Contentamento e morte na paisagem).
O Nunca Mais é de planície e fendas.
É de abismos e arroios.
É de perpetuidade no que pensas efêmero
E breve e pequenino
No que sentes eterno.
Nem é corvo ou poema o Nunca Mais.


VI


Tem nome veemente. O Nunca mais tem fome.
De formosura, desgosto, ri
E chora. Um tigre passeia o Nunca Mais
Sobre as paredes do gozo. Um tigre te persegue.
E perseguido és novo, devastado e outro.
Pensas comicidade no que é breve: paixão?
Há de se diluir. Molhaduras, lençóis
E de fartar-se,
O nojo. Mas não. Atado à tua própria envoltura
Manchado de quimeras, passeias teu costado.
O Nunca Mais é a fera.


VII


Rios de rumor: meu peito te dizendo adeus.
Aldeia é o que sou. Aldeã de conceitos
Porque me fiz tanto de ressentimentos
Que o melhor é partir. E te mandar escritos.
Rios de rumor no peito: que te viram subir
A colina de alfafas, sem éguas e sem cabras
Mas com a mulher, aquela,
Que sempre diante dela me soube tão pequena.
Sabenças? Esqueci-as. Livros? Perdi-os.
Perdi-me tanto em ti
Que quando estou contigo não sou vista
E quando estás comigo vêem aquela.


VIII


Aquela que não te pertence por mais queira
(Porque ser pertencente
É entregar a alma a uma Cara, a de áspide
Escura e clara, negra e transparente), Ai!
Saber-se pertencente é ter mais nada.
É ter tudo também.
É como ter o rio, aquele que deságua
Nas infinitas águas de um sem-fim de ninguéns.
Aquela que não te pertence não tem corpo.
Porque corpo é um conceito suposto de matéria
E finito. E aquela é luz. E etérea.
Pertencente é não ter rosto. É ser amante
De um Outro que nem nome tem. Não é Deus nem Satã.
Não tem ilharga ou osso. Fende sem ofender.
É vida e ferida ao mesmo tempo, "Esse"
Que bem me sabe inteira pertencida.


IX


Ilharga, osso, algumas vezes é tudo o que se tem.
Pensas de carne a ilha, e majestoso o osso.
E pensas maravilha quando pensas anca
Quando pensas virilha pensas gozo.
Mas tudo mais falece quando pensas tardança
E te despedes.
E quando pensas breve
Teu balbucio trêmulo, teu texto-desengano
Que te espia, e espia o pouco tempo te rondando a ilha.
E quando pensas VIDA QUE ESMORECE. E retomas
Luta, ascese, e as mós vão triturando
Tua esmaltada garganta… Mesmo assim mesmo
Canta! Ainda que se desfaçam ilhargas, trilhas…
Canta o começo e o fim. Como se fosse verdade
A esperança.


X


Como se fosse verdade encantações, poemas
Como se Aquele ouvisse arrebatado
Teus cantares de louca, as cantigas da pena.
Como se a cada noite de ti se despedisse
Com colibris na boca.
E candeias e frutos, como se fosses amante
E estivesses de luto, e Ele, o Pai
Te fizesse porisso adormecer…
(Como se se apiedasse porque humana
És apenas poeira,
E Ele o grande Tecelão da tua morte: a teia).
Como se fosse vão te amar e por isso perfeito.
Amar o perecível, o nada, o pó, é sempre despedir-se.
E não é Ele, o Fazedor, o Artífice, o Cego
O Seguidor disso sem nome? ISSO…


O amor e sua fome.
E fez-se luz na minha cabeça! (E esta nota é minha).

A duração, seja os séculos para as civilizações, seja os anos e as dezenas de anos para o indivíduo, tem uma função darwiniana de eliminação do inapto. O que está apto para tudo é eterno. É apenas nisto que reside o valor daquilo a que chamamos a experiência. Mas a mentira é uma armadura com a qual o homem, muitas vezes, permite ao inapto que existe em si sobreviver aos acontecimentos que, sem essa armadura, o aniquilariam (bem como ao orgulho para sobreviver às humilhações), e esta armadura é como que segregada pelo inapto para prevenir uma situação de perigo (o orgulho, perante a humilhação, adensa a ilusão interior). Subsiste na alma uma espécie de fagocitose; tudo o que é ameaçado pelo tempo, para não morrer, segrega a mentira e, proporcionalmente, o perigo de morte. É por isso que não existe amor pela verdade sem uma admissão ilimitada da morte. A cruz de Cristo é a única porta do conhecimento.

Simone Weil, in A Gravidade e a Graça


A música, tal como os livros, a vela, a fotografia, a pintura, é um dos outros amores eternos da minha vida. Uma das primeiras músicas que posto aqui é dos The Verve, porque é preciso quebrar o nosso próprio molde e é isso mesmo que faço em cada novo ciclo, até ao dia em que me cresçam asas.




'Cause it's a bittersweet symphony, this life
Try to make ends meet
You're a slave to money then you die
I'll take you down the only road I've ever been down
You know the one that takes you to the places
where all the veins meet yeah,


No change, I can change
I can change, I can change
But I'm here in my mold
I am here in my mold
But I'm a million different people
from one day to the next
I can't change my mold
No, no, no, no, no


Well I never pray
But tonight I'm on my knees yeah
I need to hear some sounds that recognize the pain in me, yeah
I let the melody shine, let it cleanse my mind, I feel free now
But the airways are clean and there's nobody singing to me now


No change, I can change
I can change, I can change
But I'm here in my mold
I am here in my mold
And I'm a million different people
from one day to the next
I can't change my mold
No, no, no, no, no
I can't change
I can't change


'Cause it's a bittersweet symphony, this life
Try to make ends meet
Try to find some money then you die
I'll take you down the only road I've ever been down
You know the one that takes you to the places
where all the things meet yeah


You know I can change, I can change
I can change, I can change
But I'm here in my mold
I am here in my mold
And I'm a million different people
from one day to the next
I can't change my mold
No, no, no, no, no


I can't change my mold
no, no, no, no, no,
I can't change
Can't change my body,
no, no, no


I'll take you down the only road I've ever been down
I'll take you down the only road I've ever been down
Been down
Ever been down
Ever been down
Ever been down
Ever been down
Have you ever been down?
Have you've ever been down?





Onde o amor impera, não há desejo de poder; e onde o poder predomina, há falta de amor. Um é a sombra do outro.

Carl Sagan


Artigo escrito por Vera Filizzola e originalmente reproduzido no site Jornal Infinito.

"Por outras palavras: as pessoas intuem uma forma de inteligência que, no passado, organizou o universo, e a personalizam chamando-a Deus”.
David Bohm

“Poderíamos imaginar o místico como alguém em contacto com as espantosas profundezas da matéria ou da mente subtil, não importa o nome que lhes atribuamos”.
David Bohm

Nesta série não poderia faltar a presença de David Bohm, uma combinação rara de cientista filósofo e a sua teoria sobre a origem da vida, da realidade, do universo visível e ... mais além.

David Bohm foi considerado um dos maiores físicos especulativos do mundo e um dos teóricos mais influentes da física moderna. Seu primeiro livro (1957) “Casualidade e Acaso na Física Moderna”, tornou-se um clássico no campo da mecânica quântica e é utilizado profusamente em universidades de todo o mundo. Bohm foi aluno de J. Robert Oppenheimer e durante a Segunda Guerra Mundial estudou os efeitos do plasma nos campos magnéticos. Juntamente com outros cientistas – “chegou a uma teoria que desempenha papel importante nos estudos da fusão – fenómeno hoje conhecido como “difusão Bohm”.

Nos últimos anos da sua vida o cientista dedicava-se ao estudo dos fundamentos da teoria quântica e da relatividade, bem como à sua significação filosófica, incluindo as pesquisas feitas no Lawrence Radiation Laboratory, em Berleley.

Pesquisando a natureza da consciência, devido aos problemas que encontrou na mecânica quântica, Bohm descobriu Krishnamurti, o grande filósofo hindu, com que atou uma forte amizade. Juntos, promoveram palestras e debates sobre assuntos importantes e que depois foram publicados em livros.

A exemplo de Fritz Kunz, David Bohm é um dos pouquíssimos cientistas que “por intermédio da ciência” percebeu um universo de verdade, beleza, significação e até bondade, tornando essa percepção convincentemente viva para os demais.

A sua teoria da Ordem Implícita emergiu dos estudos do cientista sobre as variáveis ocultas e a interpretação superficial da mecânica quântica – propondo que uma ordem oculta actua sob o aparente caos e falta de continuidade das partículas individuais de matéria descritas pela mecânica quântica. Bohm, a exemplo de Einstein, mas por razões diferentes, nunca aceitou as interpretações correntes da teoria quântica.

A Teoria da Ordem Implícita
exposta por David Bohm

A ideia básica da ordem implícita: “Em geral, a totalidade da ordem abrangente não se pode tornar manifesta para nós; somente um certo aspecto dela se manifesta. Quando trazemos essa ordem abrangente para o aspecto manifesto, temos uma experiência de percepção. Mas isso não quer dizer que a totalidade da ordem seja apenas aquilo que se manifesta. Na visão cartesiana, a totalidade da ordem, pelo menos potencialmente, é manifesta, embora não saibamos como manifestá-la por nós mesmos. Precisaríamos de microscópios, telescópios e outros instrumentos mais”.

A sugestão básica da teoria de Bohm, de início, é a de que vivemos num mundo multidimensional e a nossa moradia está situada no nível mais óbvio e superficial: o mundo tridimensional dos objetos, espaço-tempo, ou seja, na Ordem Explícita. Neste nível, explica Bohm, “a matéria é de graduação densa e embora possa ser descrita em relação a si mesma, não é a essa a maneira de a explicar e entender com clareza. Infelizmente, é nesse nível que muitos físicos trabalham hoje em dia, apresentando as suas descobertas sob a forma de equação de significado obscuro”.

Então, o que fazer? Bohm indica o caminho: avançar para um nível mais profundo: para a – Ordem Implícita – a fonte e o fundo abrangente de toda a nossa experiência física, psicológica e espiritual. Esta fonte está situada numa dimensão de extrema subtileza, ou seja, na Ordem Superimplícita. E não termina aí, além dela pode-se postular muitas ordens semelhantes “mergulhando numa fonte ou esfera infinita –n-dimensional”.

A filósofa Renèe Weer perguntou a Bohm em entrevista, se isso ocorreria como na teoria de campo de Einstein. Bohm respondeu: “Na ordem implícita, não somente lidamos sempre com o todo (como faz a teoria de campo), mas também dizemos que as conexões do todo nada têm a ver com a localização no espaço e no tempo, mas com uma qualidade inteiramente diversa, denominada abrangência”. A filósofa e entrevistadora pediu maiores explicações: por outras palavras, o importante é a inexistência de locais de cruzamento ou travessia?, perguntou ela. A resposta de Bohm: “Nos modelos antigos, ou uma partícula cruza um lugar, ou uma força ou campo de energia cruza esse lugar; portanto, do ponto de vista da ordem implícita, não vemos distinção fundamental entre Einstein e Newton. Dizemos que são diferentes, mas ambos diferem na mesma medida da ordem implícita”.

O Holomovimento

Ao fundo vasto e dinâmico desta teoria, Bohm chamou –Holomovimento. Segundo Bohm, o holomovimento está situado na esfera do que é manifesto. O movimento básico do holomovimento é o recolhimento e o desdobramento.

“Afirmo que toda a existência é, basicamente, um holomovimento que se manifesta numa forma relativa ente estável”.

Bohm explica que o fluxo está, pelo menos, numa condição de equilíbrio “fechando-se como vórtice que se fecha sobre si mesmo, embora continue a mover-se”.

A entrevistadora quer saber mais – “O senhor disse que essas seriam formas mais densas de matéria e não mais subtis ou menos estáveis”.

Bohm: “Digamos que são formas mais estáveis de matéria. Veja, até a nuvem conserva uma forma estável, de modo a ser vista como uma manifestação do movimento do vento. Da mesma maneira, a matéria como que formaria nuvens no interior do holomovimento e elas manifestariam o holomovimento aos nossos sentidos e pensamentos comuns”.

Seriam todas as entidades e... nós mesmos, com todas as nossas faculdades, formas do holomovimento?

Bohm: “Sim, e também as células, os átomos. Acrescento que isso começa a favorecer a compreensão da mecânica quântica: esse desdobramento constitui uma ideia directa do que é entendido pela matemática da mecânica quântica. Estamos a falar precisamente sobre o que chamamos transformação unitária ou descrição matemática básica do movimento na mecânica quântica. Trata-se simplesmente da descrição matemática do holomovimento”.

Relação entre o Holomovimento e a Matemática da Moderna Teoria Quântica

Bohm: “A matemática moderna da teoria quântica considera a partícula como um estado quantizado do campo, Istoé, um campo espalhado no espaço, mas, de alguma forma misteriosa, dotado de um “quantum” de energia. Cada onda do campo apresenta um certo “quantum” de energia proporcional à sua frequência. Considerando-se o campo electromagnético no espaço vazio, por exemplo, verá que cada ponto possui aquilo que se chama energia em ponto zero, abaixo do qual não pode descer, mesmo não havendo energia disponível. Se se pudesse juntar todas as ondas numa região qualquer, descobriria que estão dotadas de uma quantidade infinita de energia já que é possível um número infinito de ondas. Entretanto, talvez estejamos certos ao supor que a energia não pode ser infinita, que não é possível continuar adicionando infinitamente ondas cada vez mais curtas, cada qual contribuindo para a energia. Deverá haver uma onda de comprimento mínimo, caso em que o número total de ondas saia finito, como finita também seria a energia.

Qual seria o comprimento mínimo? Parece existir razão para suspeitar que a teoria gravitacional será capaz de proporcioná-lo, de acordo com a relatividade geral, o campo gravitacional também determina a significação de “comprimento” e mensuração. Quando afirmamos que o campo gravitacional é constituído de ondas quantizadas dessa forma, descobre-se que existe um determinado comprimento abaixo do qual o campo gravitacional se tornaria indefinível em virtude do movimento em ponto zero; não se poderia, então, definir o comprimento. Assim, pode-se afirmar que a propriedade da mensuração, o comprimento, desaparece a curtas distâncias, num local em torno de 10‾33 cms. É uma distância bem pequena, pois as distâncias mais curtas que os físicos demonstraram são de 10‾16 cms, mais ou menos, ou seja, um longo caminho a percorrer. Caso se avaliasse a quantidade de energia no espaço, com essa onda de comprimento mínimo, concluir-se-ia que a energia existente num centímetro cúbico ultrapassa de muito a energia total da matéria conhecida no universo.

Como entender tal coisa?

Assim: a teoria moderna afirma que o vácuo contém toda a energia até então ignorada (pelos físicos) por não poder ser medida por instrumentos. Ora, nos termos da filosofia, apenas o que pode ser medido por instrumentos dever ser considerado real, em que pese o facto de alguns físicos informarem a existência de partículas absolutamente não-mensuráveis por qualquer instrumento. Só o que se pode dizer é que o actual estágio da física teórica implica a aceitação de que o espaço vazio possui essa energia, sendo a matéria tão somente um pequenino desdobramento dela. Assim, a matéria não passa de uma minúscula onda nesse portentoso oceano de energia, embora dotada de relativa estabilidade e revestida de caráter manifesto. Adianto, pois, que a ordem implícita aponta para uma realidade que ultrapassa de muito aquilo que denominamos matéria. A matéria é apenas uma ondazinha nesse contexto... Nesse oceano de energia, precisamente, que não está primordialmente no tempo e no espaço, mas na ordem implícita... Não manifesta. E pode manifestar-se nessa pequenina porção de matéria... Supõe-se que a fonte última é imensurável, fora do alcance de nosso conhecimento. São estes os termos da física contemporânea.

Bohm faz uma importante descoberta , esclarecendo como a energia que emana do Todo, da ordem implícita, pode assumir aspectos diferentes em indivíduos diferentes. Ele esclarece as dúvidas dizendo que “o todo é enriquecido pela introdução da diversidade e pela realização da unidade da diversidade... A individualidade só é possível enquanto desdobramento do todo."

Seria ela, então, um egocentrismo?

O cientista-filósofo afirma que o egocentrismo não pode ser confundido com individualidade, o primeiro é baseado na auto-imagem, um erro, uma ilusão. A segunda desdobra-se a partir do todo de maneira particular e num momento particular.

A Evolução

A natureza, sob determinados aspectos, cria através da evolução. Bohm já havia manifestado, na sua teoria, assertivas muito originais como: “somos capazes de ordenar o que fazemos, podemos desempenhar um papel funcional na produção de uma ordem superior, que seria inviável sem nós. Não apenas a modificamos levemente, mas, principalmente, embora provoquemos minúsculas mudanças no todo, isso é crucial para que essa ordem possa transformar-se em algo novo, capaz de pôr em ação o seu potencial... Somos parte do movimento, não há separação entre nós e ele; somos parte da maneira com que se molda a si próprio”.

O Génesis – A Criação do Universo

“A idéia actual do universo pode representar algum estágio de um universo maior, um universo de luz. Até onde podemos perceber, esse universo de luz é eterno. Entretanto, a certa altura, alguns desses raios luminosos se juntaram e produziram a grande explosão – o Big-Bang. Isso desencadeou o nosso universo, que também terá um fim”.

O cientista especifica onde está situado este universo luminoso – além do tempo – o que pode significar que existam outros universos além do nosso, com várias idades, várias eternidades, e necessariamente, não serão sucessivos.

Descartes, na física, vê o movimento como sendo uma entidade ou qualquer coisa que se mova de um ponto a outro. O holomovimento de Bohm não concorda com o pensamento cartesiano, o seu holomovimento é manifestação e não-manifestação. Nele, a ordem implícita se torna manifesta e não-manifesta e assim por diante.

O Universo Pensa? Criação e Seleção

"Sendo a ordem explícita – o universo de luz – a fonte de toda a manifestação, podemos supor que, talvez, o universo pensa... O universo tenta uma variedade de formas. A selecção natural explica como as coisas sobrevivem depois da sua emergência ou aparição, mas não explica porque tantas formas surgiram. Parece existir uma tendência em produzir formas e estruturas, sendo a sobrevivência ou selecção natural um mero mecanismo que escolhe as formas destinadas a durar. Toda a forma incompatível consigo mesma ou com o meio ambiente está fadada ao desaparecimento. Penso que o universo aprende”.

A Produção de Formas

Bohm: A semente: energia e nutrientes vêm do sol, doar, da terra, da água e do vento, mas a própria semente tem pouquíssima energia. No entanto, possui a forma da planta e essa minúscula energia ou forma se imprime em todos os outros factores para produzir a planta. Essa pitada de energia governa, de algum modo, o desenvolvimento subsequente, de modo que o sistema inteiro se destina à produção de uma planta e não de um cão, de um gato ou de outra coisa qualquer... Pensamento e matéria são ordens muito parecidas. Podemos dizer que a natureza ou a matéria também é criatividade e pensamento intuitivo. Assim, num certo sentido, a natureza tem vida. E inteligência. Ela é mental e material, como nós. Se alguém é percebido como inimigo, a matéria se organiza de maneira diferente do que o faria caso se tratasse da percepção de alguém amistoso. O eléctrão faz praticamente o mesmo que nós, ao reagir a determinada situação. Ele observa o ambiente.

O Que Seria a Matéria para Bohm?

Bohm, falando sobre a metáfora existente no misticismo: iluminado, iluminação, fez-se a luz - chega a uma conclusão muito importante sobre a origem da matéria à luz da física moderna.
Bohm: “Quando um objeto se aproxima da velocidade da luz, segundo a relatividade, seu espaço interno e seu tempo interno mudam; o relógio se atrasa em relação a outras velocidades e a distância é encurtada. Descobre-se que as duas extremidades do raio luminoso não guardam tempo ou distância entre si, representando consequentemente um contacto imediato (esclarecido pelo físico G. N. Lewis nos anos 20). No ponto de vista da moderna teoria de campo, os campos fundamentais são os dotados de energia superior, em que a massa pode ser negligenciada; eles poderiam mover-se à velocidade da luz. A massa é um fenómeno originado da ligação dos raios luminosos no seu avanço e recuo, uma espécie de consolidação num dado esquema. Então, é como se a matéria fosse luz consolidada, congelada. A matéria não se constitui apenas de ondas electromagnéticas, mas, num certo sentido, de outros tipos de ondas que avançam à mesma velocidade. Portanto, toda a matéria é condensação de luz em esquemas que avançam e recuam a velocidades médias, inferiores à da luz. O próprio Einstein teve vislumbres dessa ideia. Diríamos que vir à luz, significa assumir a actividade fundamental onde a existência se embasa, ou, pelo menos, aproximar-se disso”.
“A luz é o meio através do qual o universo inteiro se concentra em si mesmo... É uma condição real, pelo menos no quadro da física... A luz é energia, informação. Conteúdo, forma e estrutura. É o potencial de tudo”.

David Bohm preocupou-se com o tema da “consciência” e o fez de uma forma tão magistral que, resguardando-se a essência da sua interpretação, segundo a sua teoria, o neurofisiologista Antonio Damásio teve nele um precursor de monta: Bohm acreditava na consciência como não apartada da matéria e do processo neurofisiológico. Muitos dos leitores estarão curiosos em saber o que os colegas de David Bohm, os cientistas da física, pensariam sobre toda esta teoria que reunimos aqui.

Bohm: ...”A física moderna não passa de um sistema destinado a computar e fornecer resultados empíricos. De fato, considero que toda a idéia nova deve pressupor o livre jogo da mente, sem demasiada consideração pelos resultados empíricos”.

Perguntado se os físicos convencionais aceitariam a sua teoria, Bohm respondeu – Eles já aceitaram, mas acrescentou também que eles diziam-lhe o seguinte: “Para que serve? Não produz nada diferente daquilo que já fizemos. Só nos interessam resultados empíricos. – Levá-la-emos em consideração quando começar a fazê-lo, levaremos tudo em consideração”.

O físico lamentou então “um dos erros da ciência”, também os estendendo à nossa sociedade: “O resultado empírico como principal objetivo é o que apresenta como verdade, desde que tenha por trás de si argumento lógico-matemático”.

Consensos

“O electrão “observa”, “presta atenção”, reúne informação a nosso respeito, a respeito do universo inteiro. Apreende o universo e responde de acordo com essa apreensão. Portanto, num sentido literal: ele observa”.

“O ensino da física decaiu muito; foi se tornando cada vez mais dogmático e mecânico, o que é lamentável. Todas as questões candentes dos anos 30 se desvaneceram completamente. O que se faz hoje é apresentar fórmulas aos estudantes e declarar: “Isso é a mecânica quântica”. E assim a nova geração vai escrevendo livros sem uma base sólida, esquecendo as profundas questões filosóficas que sempre foram o sustentáculo da abordagem total da física”.

“Observando a natureza, veremos que formas elaboradas e complexas não podem ser explicadas pela mera exigência da sobrevivência. Se nossa noção de tempo postula a criatividade de cada momento, então, a todo o momento, é possível que surjam novas estruturas, coexistindo com algumas antigas. Podemos então dizer que a natureza está constantemente explorando novas estruturas de maneira intencional, e, quando estas se mostram capazes de sobreviver (mediante processo de reprodução), tomam corpo e se tornam estáveis”.

“Antes da grande explosão – Big-Bang – não existiam moléculas, quarks e átomos, segundo declara a física moderna. Se pois afirmamos que havia leis fixas e imutáveis que regiam moléculas e átomos, o que acrescentaremos se remontarmos ao tempo onde eles sequer existiam? A física nada tem a dizer sobre isto. Só pode declarar que, num determinado estágio, essas partículas se formaram. Portanto, deve ter havido um desenvolvimento real em que a necessidade se fixou mais e mais num determinado campo. Vê-se isso quando se esfria uma substância que se liquefaz: primeiro aparecem grumos líquidos transientes, que depois vão se consolidando. Os físicos explicam isso alegando que as leis das moléculas são eternas; as moléculas são meras conseqüências dessas leis, meras derivações delas”.

Recuando no tempo perguntamos: “Onde estavam as moléculas? A resposta é: Bem originalmente, protões e electrões, que eram originalmente quarks, que eram originalmente subquarks... E chegamos ao estágio em que nenhuma dessas unidades existia e no qual esse esquema todo se esfuma! Pode-se então dizer que, em geral, os campos de necessidade não são eternos: estão constantemente se formando e desenvolvendo”.

“Além de clara e profunda, a teoria de Bohm tem o mérito de poder ser considerada a primeira, em todos os tempos, a revelar e provar no plano científico, algumas verdades seculares que até então podiam apenas ser aceitas e compreendidas pela fé”.

Eduardo C. Borgonovi.

Bibliografia:
· Diálogos com Cientistas e Sábios –Renèe Weber ed. Cultrix
· O livro das Revelações – Eduardo Castor Borgonovi – ed. Alegro
· Krishnamurti, & D. Bohm – Truth and Actuality – Victor Gollanez Ltd.
· A Totalidade e a Ordem Implicada – David Bohm – São Paulo – Cultrix.


A amizade é regida pelo mesmo mecanismo que o amor, é instantânea e absoluta.

Fonte: Conversas com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco, 2002


 



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